quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Tudo no mundo é digno de reverência?


A questão da
Reverência

Você crê que todas as coisas são dignas de respeito? Você age de modo a tratar a todas as criaturas com reverência? Provavelmente não fazemos isso.  

Em nossas vidas diárias, em nossas pequenas ações, desenvolvemos (por questões egóicas e culturais) a tendência de menosprezar a vida de outras criaturas (consideradas diminutas ou inferiores a nós), ou de acreditarmos não serem dotadas da mesma qualidade de vida que nós. 
Por inúmeras questões culturais, religiosas, econômicas ou simplesmente por desprezo, soberba ou preguiça, tratamos outras formas de vida sem considerar as seríssimas questões éticas implicadas em nossas ações. 
Quase nunca vislumbramos que devemos tratar com reverência (com respeito) todas as formas de vida: não importa se é um animal, um vegetal, ou simplesmente um simples elemento da natureza. A ética do homo sapiens é ainda bastante precária, frágil, contraditória e limitada. Há bem pouco tempo atrás considerávamos negros como sendo inferiores a brancos; mulheres, como inferiores aos homens, pagãos, inferiores a cristãos, indígenas e aborígenes, inferiores aos civilizados... etc. E não poucas pessoas ainda pensam assim hoje!
Por que então esperar que o homúnculo racional venha a considerar de modo respeitoso, outras criaturas não humanas? 
Por outro lado, há alguma forma realista de sobrevivermos no mundo sem antes modificarmos radicalmente nosso modo de ver e de tratar todas as demais criaturas e coisas do mundo? Há salvação para a humanidade, em subsistindo essa moral decadente que temos praticado?

Vejam só como nos complicamos com a nossa festejada ética hipócrita contemporânea:

O Brasil é um país com abundância de recursos e por isso sempre pensamos que poderíamos abusar da natureza, lança​ndo​ nossos esgotos nos rios, ​produtos tóxicos no ar, na terra e ​no mar, cortamos florestas, depredando​ e violentando a natureza de todas as formas possíveis. 
Em nome do progresso e pelo viés lógico do 'crescimento econômico' como lei, optamos deliberadamente pelo saque voraz da natureza... Sob o pressuposto do evolucionismo cultural e sob a luz do paradigma desenvolvimentista, optamos pela exploração em todos os níveis: do átomo aos compostos químicos (tão sintéticos quanto tóxicos), das profundezas do subsolo à camada de ozônio, temos conspurcando ar, terra e mares, encantados pelo mantran mágico balbuciado pelos políticos: progresso!! progresso!!! 
Parece que nenhum dos defensores de tantas bandeiras ideológicas coloridas da Modernidade se apercebeu de que a salvação da humanidade não está no antropocentrismo desenvolvimentista, nem no seu mais novo e macabro filhote, o hiperconsumismo*. 

Eis uma questão cultural forte, disseminada e introjetada em nosso paradigma/visão de mundo, desde que nascemos: "é preciso crescer sempre!
Para respeitar este dogma nefasto, deduzimos ser imprescindível consumir cada vez mais, e mais rápido... foi então que, lá pela primeira metade do séc. XX (a partir de 1928), alguns iluminados finalmente chegaram ao formidável conceito da "obsolescência programada"*. Na outra ponta, se o político não defender ferozmente as três expressões mágicas - 'crescimento econômico', 'progresso' e 'desenvolvimento' - condena-se a jamais se eleger. 

Mas eu digo que não! Não precisamos de "mais crescimento"! A obsolescência planejada é absolutamente imoral, escandalosa e insana. Ao contrário, precisamos diminuir! E rápido! Diminuir consumo, reduzir pseudonecessidades, punir a mentira nas propagandas, repensar nosso ritmo de produção e nossos níveis de natalidade... reaprender a viver, contentar-se com menos, minguar nossa cobiça e ansiedade por mais, mais e mais!
​​Sempre nos foi passada a noção de que os recursos naturais nunca ​iriam acabar. Assim, não nos importamos, porque se o lugar onde estivéssemos não nos servisse,​iríamos adiante, usa​ndo o que há em outro... Agora, neste exato momento, estamos vivendo uma das piores crises hídricas de nossa história recente, justamente no Estado mais rico da Federação brasileira. Mas você algum dia já pensou na pegada hídrica** que deixamos, decorrente de cada coisa que consumimos? Você sabia que são necessários de 3 a 7 litros de água para produzir uma única garrafa plástica de 1 litro de água? ** (vide notas explicativas no final).

Bom, não sei quanto a você, mas me parece que tem alguma coisa realmente estranha na lógica humana. O que estamos fazendo? correr de olhos vendados em direção a um abismo não me parece uma atitude saudável!

Em relação aos animais, costumamos pensar que eles não são seres dignos de respeito e que não têm sentimentos. Mas a verdade profunda é que todas as coisas são dignas de serem tratadas com reverência.



​Empatia é a capacidade de se colocar no lugar do outro. Experimentos com animais começam a demonstrar cabalmente ​que outros animais também são capazes do mesmo comportamento. Em uma destas experiências, é colocado um rato numa pequena gaiola onde, para comer, tem que apertar uma pequena alavanca. Uma vez que esteja condicionado a isso, é colocada junto à gaiola dele uma gaiola com outro rato ligado a fios. Cada vez que o primeiro rato aciona a alavanca para pegar comida, o segundo rato recebe um choque e grita de dor. Ao perceber que, para comer, o outro tem que sentir dor, o rato para de se alimentar. Isso significa que ele se importa, de alguma maneira, com a dor do outro.​ Primatas têm comportamento semelhante. Muitas vezes foram registrados ‘atos altruístas’, não somente com relação a seus companheiros de espécie, mas, também, com relação a outros seres, como no caso de um chimpanzé que foi observado pegando um pássaro caído, colocando-o num galho de árvore e abrindo suas asas. O que significa isso? Ele sabe que se trata de um pássaro e sabe como esse animal se comporta. Há, portanto, registros de animais salvando vidas de outros animais e de seres humanos, às vezes até com sacrifício da sua própria vida. 

Isso indica que não podemos dizer que os outros não têm 'sentimentos' bem semelhantes ou que não sofrem como nós. Se até os animais têm comportamento de 'empatia', algo semelhante à solidariedade e capacidade de consolo, por que seres humanos se colocam tão acima de todo o resto, em termos de consideração e respeito?

Atenção! Se não houver um motivo plausível, não temos o direito de destruir qualquer coisa ou de causar qualquer sofrimento. Essa é a única ética possível. Essa é a ética da sobrevivência. Esse é um questionamento que cada um deve fazer com relação a si mesmo e à sua vida no mundo.

escrito por Silvio M. Maximino, inspirado e baseado em artigo com o mesmo tema, escrito por Meihō Genshō





* Obsolescência programada (ou planejada) significa reduzir propositadamente a vida útil de um produto para aumentar o consumo de versões mais recentes. Planejar o envelhecimento de um produto é uma ação praticada deliberadamente por diversos setores da indústria. Em outras palavras, o produto já é desenvolvido para durar apenas um período programado pelo seu fabricante. Com esta prática, o consumidor já compra um produto que tem validade mais curta do que deveria. O próximo passo é não funcionar adequadamente após o limite estabelecido pela fábrica ou parar de funcionar.

A obsolescência pode ocorrer de três formas: programada, perceptiva ou funcional.
Obsolescência programada (ou planejada): acontece quando há uma ação deliberada da empresa fabricante que força o cliente a adquirir um novo modelo do bem. É o caso dos aparelhos domésticos ou equipamentos eletrônicos.
Obsolescência perceptiva: ocorre quando o produtor lança uma nova versão mais atraente do produto e o consumidor é induzido a comprar a nova versão, mesmo quando o modelo antigo continua operacional.
Obsolescência funcional (ou técnica): ocorre quando um produto ou serviço perde a sua utilidade porque foi desenvolvido outro mais prático para o substituir; quando não faz sentido continuar a fabricação devido a uma grande evolução nos outros produtos; quando se torna mais caro consertar o antigo do que adquirir um novo. 

** A água virtual é aquela consumida durante todo o processo de produção; em geral, está 'oculta' e dificilmente é mencionada ou conhecida. Esta água inclui aquela ingerida pelos animais e a usada no cultivo de seus alimentos e na limpeza de seus dejetos, enfim em todas as etapas do processamento para se atingir o produto final.
Sendo assim, cada norte-americano consome 2.800 metros cúbicos de água por ano (tanto a água da chuva como a de irrigação estão incluídas no total), boa parte dela empregada na produção de alimentos e mercadorias. Cerca de um quinto dessa água virtual vem de outros países, sobretudo da bacia do rio Yangtze, na China. A informação é da Water Footprint Network, uma organização não governamental de origem holandesa que trabalha para minimizar o impacto da pegada hídrica global.
A entidade quer chamar atenção, primeiro, para o excessivo volume de água embutido na comida; segundo, para o fato de que os países exportadores de alimentos também estão exportando sua água. O diretor científico da entidade, Arjen Hoekstra (Universidade de Twente, Holanda), produziu um dos documentos essenciais da organização, The Water Footprint of Food, que esmiúça todos os pontos de entrada da água no agronegócio. Ele usa a indústria da carne como exemplo:
Num sistema de produção industrial de carne, são necessários, em média, três anos até que o animal possa ser abatido para produzir 200 quilos de carne desossada. No período, o animal consome 1.300 quilos de grãos (trigo, aveia, cevada, milho, ervilhas, farinha de soja, e outros grãos), 7.200 quilos de fibras (pastagem, palha), 24 metros cúbicos de água para beber e 7 metros cúbicos de água para outros cuidados. Assim, para produzir um quilo de carne desossada, usamos cerca de 6,5 quilos de grãos, 36 quilos de fibras e 155 litros de água. Além disso, a produção da ração exige cerca de 15.300 litros de água em média. A pegada hídrica de 1 quilo de bife sobe, então, a 15.500 litros de água. Isto não inclui o volume de águas poluídas que podem se originar do uso de fertilizantes na produção da razão ou do excesso de estrume que atinge o sistema hídrico. Estes números são estimativas globais médias; a pegada hídrica da carne pode variar muito dependendo da região de produção, a composição da ração e a origem de seus ingredientes.
O documento também faz uma lista de alimentos, estimando quantos litros de água são necessários, em média, para produzir um quilo de produto final:
Chocolate: 24.000 litros; 
Queijo: 5 mil litros; 
Carne de porco: 4.800 litros; 
Azeitonas: 4.400 litros; 
Frango: 3.900 litros; 
Alface: 130 litros
Café: 140 litros/ xícara; 
Vinho: 120 litros/ taça; 
Cerveja: 75 litros/ copo; 
Chá: 30 litros/ xícara

Além disso, são necessários:
3.340 Litros de água para se produzir 1 quilo de ovos;
11.535 Litros de água para se produzir 1 quilo de salsicha;
1.151 Litros de água para produzir 1 quilo iogurte;
859 Litros de água para se produzir 1 quilo banana;
655 Litros de água para se produzir 1 quilo de uva;
457 Litros de água para se produzir 1 quilo de laranja;
697 Litros de água para se produzir 1 quilo de maça;
909 Litros de água para se produzir 1 quilo de milho;
276 Litros de água para se produzir 1 quilo de morango;
208 Litros de água para se produzir 1 quilo de berinjela;
255 Litros de água para se produzir 1 quilo de batata;
359 Litros de água para se produzir 1 quilo de feijão;
 
Uma dieta com consumo regular de carne requer 60% mais de água que uma dieta vegetariana. Estima-se que o consumo de carne vá duplicar até 2050.

Segundo dados divulgados pela FAO*** (2012), 70% de toda água doce disponível no planeta é utilizada na agricultura e sua demanda cresce a um ritmo duas vezes maior que o crescimento populacional.
No Brasil, são produzidas 550 mil toneladas de garrafas PET por ano, das quais boa parte é descartada na natureza.  100 toneladas de plástico reciclado evitam a extração de 1 tonelada de petróleo.  
Quando bebemos água na garrafinha, pagamos cerca de 2 mil vezes mais do que se consumíssemos pela torneira. Segundo a Bottled Water Blues, 90% do custo dessa água está na fabricação de rótulo, tampa e garrafa, que usam recursos como petróleo.
 Em seu projeto Think Outside the Bottle ("pensando fora da garrafa", em tradução livre), a ambientalista Annie Leonard questiona os gastos por trás da água que bebemos: enquanto há bilhões de pessoas sem acesso à água no mundo, os governos gastam milhões de dólares para cuidar do descarte da enorme quantidade de garrafas plásticas. A solução, segundo ela, seria inverter o foco e gastar o dinheiro melhorando o sistema de água que sai da nossa torneira. Comece na sua casa: compre um filtro e abandone a água engarrafada.  
Apenas na etapa da produção, uma garrafa PET de 50 gramas acarreta um impacto ambiental de emissões atmosféricas de CO2 e gases equivalentes da ordem de 18 gramas.

Mais dados:
• O mundo utiliza mais ou menos um milhão de sacolas plásticas a cada minuto; cada pessoa, na Terra, usa 150 sacolas por ano para cada pessoa.
• A província canadense de Ontário baniu sacolas plásticas das lojas das adegas governamentais em 2008 resultando em 80 milhões de sacolas a menos que deixam de ser utilizadas anualmente.
• A China baniu as sacolas plásticas em 2008. Bangladesh foi o primeiro país no Hemisfério Sul a bani-las em 2002. Papua New Guinea, Butão, Taiwan e Botswana o seguiram.
• A Irlanda introduziu uma taxa sobre as sacolas plásticas em 2002. Em poucos meses o número de sacolas distribuídas pelos supermercados caiu em 90%.
• São necessários em torno de 11 barris de petróleo para se fazer uma tonelada de sacolas plásticas. Antes de banir, a China usava mais sacolas plásticas do que qualquer outro país e desperdiçavam 37 milhões de barris de petróleo em cada ano.
 


***A ONU revela que aproximadamente 70% de toda a água disponível no mundo é utilizada para irrigação. No Brasil, esse índice chega a 72%. Pelas análises dos últimos relatórios divulgados pela ONU, o uso da água tem crescido a uma taxa duas vezes maior do que o crescimento da população ao longo no último século. A tendência é que o gasto seja elevado em até 50% até 2025 nos países em desenvolvimento; e em 18% nos países desenvolvidos. Hoje, 780 milhões de pessoas ainda vivem sem acesso a água potável para beber e muitas outras sem saneamento básico.

Fontes: 

Arjen Y. Hoekstra e Ashok K. Chapagain, Globalization of Water; Banco de Dados Water Footprint, Universidade de Twente, Holanda, Waterfootprint.org .

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