domingo, 25 de dezembro de 2016

Papai Noel e Natal



Papai Noel existe! Mas, a que preço?


Muitos defendem que a crença no Papai Noel, como em tantos outros contos de fadas, auxilia no desenvolvimento mental das crianças. Dizem que a descoberta da verdade sobre “um velhinho gordo que espia as crianças e vai a suas casas no Natal para entregar presentes se tiverem se comportado bem” estimula o processo de amadurecimento da sua personalidade.  Bom, nem todos concordam com tal tese: como, afinal, a “maior mentira coletiva do planeta” poderia ser positiva se ela corrói a confiança entre as crianças e seus pais? 
Por um lado, a criança muito cedo entende que os presentes funcionam como um tipo de suborno para que se comportem bem. Por outro, se seus pais (em quem confiam) lhes mentem descaradamente –ainda que com boas intenções - por tantos anos sobre algo tão relevante (para a criança), por que eles, seus filhos, devem confiar nos pais quando estes lhes aconselharem, por exemplo, sobre entorpecentes, ou sobre bebidas alcoólicas ou sobre sexo? O que mais é mentira? Se lhes mentiram sobre o Natal, por que deveriam confiar nos demais ensinamentos sobre qualquer outro tema relevante? Além disso, “filhos não devem mentir para seus pais”. Se mentirem, serão castigados ou no mínimo, censurados. Mas, cá entre nós: e quando os pais mentem para seus filhos? Ficarão impunes? Sabe de nada, inocente...

É verdade que há estudos nas áreas da Psicologia e da Sociologia avaliando efeitos das violências física e psicológica na mente das crianças. Então surgem algumas preocupações: pode-se considerar a encenação natalina como um tipo de violência simbólica contra a frágil personalidade infantil? Ou na verdade seria uma forma legítima de preparar nossos filhos para enfrentarem com mais maturidade e resiliência, a falsidade, a insinceridade e a desonestidade que eles encontrarão futuramente? Filosoficamente, porém, temos a questão ética: Uma mentira se torna mais admissível ou menos imoral por ter se tornado culturalmente aceita por uma coletividade (adultos), em detrimento de outro grupo (as crianças)?

Sim, é claro! Ninguém aqui se tornou alcoólatra ou delinquente por causa da conspiração mercadológica do Papai Noel. E, convenhamos! Comparado a nossos legisladores e gestores públicos, vê-se fácil, fácil, que o velho Noel é o menor de nossos problemas. 
É verdade que os contos, os filmes, as músicas, os banquetes e enfeites natalinos têm sua aura romântica, além do característico apelo emocional. Mas, antropologicamente, o que “alhos têm a ver com bugalhos”? ou seja: o que a lenda de Noel tem a ver com a celebração cristã da epifania do Deus hebraico-judaico-cristão? Absolutamente nada. Mas, um profissional da Propaganda bem treinado sempre evocará referências sobre uma suposta origem cristã de Noel, quando a rigor, sabemos das suas origens pagãs nórdicas. 
Por fim, quando o argumento historiográfico for ralo abaixo, apelará para a semiótica, dizendo que Noel representa a fraternidade, a solidariedade, a caridade cristã e... presentes, é claro!! Agora é a vez dos adultos engolirem a isca. E, às compras!!!


texto publicado no Jornal da Cidade em 25 de dezembro de 2016, pág. 26

http://www.jcnet.com.br/editorias_noticias.php?codigo=246339

sábado, 17 de dezembro de 2016

Educação, ego, destreza, medo, cultura, liberdade... - excertos de Krishnamurti

Embora seja difícil demonstrar como a mente funciona na realidade, vou tentar fazê-lo; e podeis “experimentar”, e ver por vós mesmos. Sabemos que o pensar é uma reação  fundada em (um fundo de) condicionamento” (background). Pensais como hinduísta, como parse*, (…) não apenas no vosso pensar consciente, mas também no pensar inconsciente. Vós sois o background, não sois separado, pois não há pensador separado do background; e a reação desse background é o que chamais pensar.

* parse: antigo grupo de persas zoroastristas que emigrou e se estabeleceu na Índia.
(Que Estamos Buscando, 1ª ed., pág. 179).

Esse background, quer culto, quer inculto, instruído ou ignorante, está sempre correspondendo a algum desafio, a algum estímulo, e essa reação cria não apenas o chamado presente, mas também o futuro. Tal é o nosso processo de pensar.
(Idem, pág. 179)

(…) O que eu digo é que a experiência baseada no conhecimento, no nosso background, é meramente o prolongamento desse fundo e, por conseguinte, não é experiência nova. (…) Só posso reagir ao desafio de maneira nova quando a minha mente compreendeu o background e dele se libertou. (…)
(O Homem Livre, pág. 44)

(…) Quando pensais, o vosso pensar é, por certo, resultado do passado, do vosso condicionamento, da vossa crença, do vosso fundo consciente e inconsciente. De acordo com vosso background reagis, e essa reação é chamada pensar; e por meio desse pensar quereis resolver os vossos problemas. E achais que, quanto mais adquirirdes, (…) mais acumulardes experiência, tanto maior se vos tornará a capacidade de atender ao problema e resolvê-lo.
(Viver sem Temor, pág. 68)

Vejamos agora a relação entre o educador e o educado: Será que o professor, consciente ou inconscientemente, mantém um sentimento de superioridade, colocando-se num pedestal e fazendo o aluno sentir-se inferior, como alguém que tem de ser ensinado? Nesse caso, evidentemente, não há relacionamento.
(Cartas às Escolas, I, pág. 24)

O pensar, sem dúvida, é uma reação. Se vos faço uma pergunta, a essa pergunta vós reagis; reagis de acordo com vossa memória, vossos preconceitos, vossa educação, (…) com todo o fundo do vosso condicionamento; e em conformidade com tudo isso vós respondeis, pensais (…) O centro desse fundo é o “eu” com sua atividade (…)
(A Renovação da Mente, pág. 10-11)



terça-feira, 13 de dezembro de 2016

​ Eus, movimento

Se em mim houvesse perfeição, não haveria sombras, nem variação, nem espaços. 
Sem espaços não haveria movimento e, sem movimento, eu não seria. 
Sou os todos que fui, os que sou, os que ainda serei. 
Sou movimento. Fragmento. 
Não sei o que é perfeição e tudo o que faço projeta minha própria ambivalência. 
Meu amor, inclusive, meu amor condicional. 
Minhas crenças, minhas descrenças, meus sonhos, tudo o que penso absoluto é apenas um fragmento que aponta para o horizonte. 
São confissões que não dizem nada sobre o mundo, nem sobre a vida, nem sobre a morte, nem nada que seja além de mim. 
Eus, movimento.

sábado, 10 de dezembro de 2016

Heróis: entre deuses e homens



Heróis e anti-heróis: onde estão?


É sério! Heróis e heroínas não são invenção de Hollywood! Muito antes da escrita existir, já eram cantados entre os indígenas, nórdicos, asiáticos, orientais, africanos e aborígenes. Posteriormente, valiosos livros sagrados passaram a narrar poeticamente seus dramas e tragédias, seus conflitos, dilemas, derrotas e vitórias. Ainda que dotados de admiráveis habilidades, heróis e heroínas sempre foram mortais e também cometiam erros. Isso não os impedia de se consagrarem legítimos líderes e inspiradores de suas gentes. Sua natureza híbrida (parte humana, parte divina), lhes conferia uma dignidade que geralmente lhes custava caro, muito caro. 

Uma coisa se sabe: eram legítimos líderes! Não se permitiam viver mediocremente e lutavam por fé, por ideal. Seu gênio, sua lealdade e coragem conferiam-lhes a relevância que lhes permitiu serem celebrados e, seus feitos, reinterpretados e recontados ao longo dos séculos, a ponto de muitos deles se tornarem paradigmas morais e pedagógicos de seus respectivos povos e nações. 


O comportamento e a visão de mundo de um líder nos afeta, afeta nossa humanidade! É nisso que um líder se distancia de um simples genitor biológico, de um mero chefe, presidente ou político medíocre. O chefe pode ser obedecido porque é temido, mas o herói, aquele que é líder, é sinceramente admirado, comanda pela adesão consciente de seus liderados. 


É verdade que a recente indústria cultural se apercebeu do potencial comercial do tema, trazendo à luz os midiáticos super-heróis das revistas em quadrinhos e da cinematografia. Pergunto: indo mais além da liberdade artística, haveria ainda hoje, espaço para líderes reais, de carne e osso? Onde estão e como vivem?

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

a verdade da estatística


"estatísticas mostram praticamente tudo, menos a verdade".
 

o que essa simples afirmação quer nos dizer?




O problema, evidentemente, não são os dados numéricos em si mesmos, mas as associações, deduções, induções, analogias e sofismas que construímos a partir deles. 

Quando nos apropriamos de textos que tentam nos convencer de alguma coisa, usando dados estatísticos, deveríamos, antes de mais nada, considerar:

1) quem colheu os dados, onde os dados foram colhidos e durante quanto tempo;
2) quem financiou (pagou) os coletores dos dados, bem como o chefe da pesquisa;
3) quais os interesses econômicos ou políticos (declarados ou não) daqueles que financiaram a coleta dos referidos dados estatísticos;
3) como foi selecionado o(s) grupo(s) de amostragem utilizado(s) para a colheita dos dados;
4) número absoluto de indivíduos pesquisados;
5) condições de controle do grupo pesquisado;
6) crenças e cultura do pesquisador responsável;
7) eventuais sofismas ocultos nas conclusões finais.

Após essas cautelas, e de posse dos dados, pode-se começar a tirar alguma conclusão provavelmente válida. 
Mas, se você não dispõe dessas informações quando lê algum artigo dito científico ou alguma notícia que cita dados estatísticos como ponto fundamental de sustentação de suas conclusões, então, lamento muito, meu caro, mas é estatisticamente provável que você esteja sendo ludibriado!
😉


Vejam abaixo, algumas anedotas que exemplificam sofismas facilmente construídos com base na utilização equivocada de dados estatísticos que muitas vezes são, em si mesmos, autênticos:

"A chance de ser morto por um conhecido é duas vezes maior do que por um estranho. Portanto, fale apenas com estranhos!"

"33% dos acidentes de trânsito envolvem pessoas embriagadas, portanto 67% estão sóbrias; logo devemos dirigir bêbados que é mais seguro." 

"Está provado que fazer aniversário é saudável. Estatísticas mostram que pessoas que fazem mais aniversários vivem mais." - S. den Hartog, Ph D. Thesis - University of Groningen  
 

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

solidão: uma doença?

"A solidão é a doença do nosso tempo"
Thich Nhat Hanh

Para uns, a evitação do estar sozinho pode se manifestar ao ligar a tevê. Assim, ela fica falando sozinha e nos “dá a impressão de ter alguém em casa”. 
Para outros, é a necessidade de programar um encontro no fim-de-semana, para evitar que se fique sozinho em casa no sábado ou domingo, ou ainda qualquer evento esportivo ou cultural “porque se não ficaria em casa sem fazer nada”...
Para outros ainda, talvez se manifeste ao acessar o celular ininterruptamente, evitando assim o silêncio ou o vazio (assista Louis C.K. falando disso), ou mesmo buscar numa relação conjugal o preenchimento do desconforto de estar sozinho. 
Há várias maneiras de sentir e evitar, das menores às maiores, e talvez a mais moderna de todas seja estar ocupado — “estamos ocupados e ficamos ocupados o dia todo para nos conectarmos, mas isso não ajuda, não reduz a quantidade de solidão em nós”, diz Thich Nhat Hanh.

Leia mais sobre esse tema acessando:
http://oficina-de-filosofia.blogspot.com.br/2013/10/a-capacidade-de-ficar-so-e-capacidade.html





sábado, 3 de dezembro de 2016

afinal, autoconhecimento vale a pena?



“Os homens viajam para se maravilharem com a altura das montanhas, com as ondas imensas do mar, com os longos cursos dos rios, com o vasto âmbito do oceano, com o movimento circular das estrelas, e passam por si mesmos sem se maravilhar”

Santo Agostinho (354-430 d.C.)
(filósofo, teólogo e bispo doutor da Igreja Católica)





“Se você conquistar o conhecimento do Eu, o significado da vida não será mais um mistério. Você compreenderá claramente o porquê e o como deste universo. Todas as coisas transcendentes serão conhecidas para você como a maçã na palma da sua mão”.
 Swami Sivananda (1887-1963)
mestre indiano de Yoga e Vedanta





Sem autoconhecimento, sem entender o funcionamento e as funções de sua máquina, o homem não pode ser livre, não pode governar a si mesmo e será para sempre um escravo.”
George Gurdjieff (1866-1949)
filósofo e místico greco-armênio





“O mais útil e o menos avançado de todos os conhecimentos humanos me parece ser o do homem; e ouso dizer que só a inscrição do templo de Delfos continha um preceito mais importante e mais difícil do que todos os grossos livros dos moralistas.”
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)
filósofo suíço






“Todos os homens deveriam lutar para aprender, antes de morrer, do que estão fugindo, para onde, e porquê.”
~ James Thurber (1894-1961), escritor e cartunista americano






“Olhe dentro das profundezas de sua própria alma e aprenda primeiro a conhecer você mesmo, então você entenderá porque essa doença tinha que acontecer a você e talvez assim você evite ficar doente dali em diante.”
Sigmund Freud (1856-1939)
médico austríaco, fundador da Psicanálise